Foi ontem.
Ou será que foi antes de antes de antes de ontem?
Foi a algumas semanas, tenho certeza.
Era sábado e eu não queria pensar em nada, pois eu não sabia
nada do que estava fazendo. Eu queria aproveitar os derradeiros prazeres da
carne, da vida, da adolescência que me foi roubada ou foi embora sem que de
fato eu soubesse como utilizá-la.
Contudo foi sem sabor, embora eu queira mais.
Tive enfim um amante, aos 21. Um real. De verdade e carne e
boca e me beijou.
E eu beijei. E eu soube do que tanto diziam. Com toda
certeza não foi o que naquelas inúmeras noites sonhei, mas foi. Foi aquilo. Algo.
Aconteceu.
E agora que ouço apenas o silencio sobre o que aconteceu,
sei que demorará a se repetir. Posso enfatizar no futuro que aconteceu aos 21
anos, quando já tiver 30. Ou posso simplesmente sair por ai com minha saia
curta, meia calça e botas e dizer enquanto peço um cigarro que estou livre. Pronta
para uso, jovem, bela e sedenta. Quem sabe o que dirão?
Eu não queria nem mesmo saber seu nome, não queria conhecer
seu amago, não queria conhecer seu ser, porque tudo isso eu sabia que não me
agradaria. Porque eu sou do grupo dos que querem mais, muito mais. Eu sou do
grupo dos que querem pessoas profundas, tristes e que falem da morte, eu sou do
grupo dos que avaliam, julgam abertamente e não acha ninguém meramente
competente para encaixe. Por isso eu só queria sentir sua pele, seu rosto, sua
boca e apenas o seu desejo se apertando entre minhas pernas. Dos pés eu já não
sabia mais mantê-los onde estavam e minha mão queria com as unhas arrancar-lhe
um arranhão para saber quem sou, do que sou feita e do que sou capaz.
Eu podia sentir seu desejo crescente, suas mãos nas minhas
pernas subindo e descendo loucamente pela meia calça e passando pelo vestido e
chegando a me causar leve e louca excitação e seus olhos que por uma hora me amedrontaram, chegaram a disparar meu raquítico coração de papel, sabendo assim, enfim que era chegada a hora.
Tudo isso, todo aquele frescor, toda aquela comoção, todo
seu desejo. E eu só queria mais. Eu
ainda quero mais. Eu ainda estou esperando por mais.
Seria pior se fosse total, se fosse alguém
do “grupo de questionadores da vida” do qual faço parte anonimamente, ah se
fosse. Seria tão mais difícil esquecer.
Embora, esteja difícil de esquecer.
E eu só quero esquecer de novo. Eu sou uma esquecedora em
minha vida. Eu apago pessoas que foram embora sem dizer adeus. Eu esqueço
momentos que podem me machucar. Eu aprendi a esquecer, eu tenho aprendido a
esquecer ao longo dos dias. Eu esqueço. Eu me forço a esquecer.
Só que dessa vez foi real, por isso os dias se prolongam e
toda forma de esquecimento, todo árduo aprendizado que tenho treinado ao longo da
vida está mais difícil dessa vez.
E me pego a imaginar. E eu sou detestável em minha inocente e sagaz imaginação.
E me pego em caricias invisíveis. Inexistentes. Vazias.
E me pego a imaginar. E eu sou detestável em minha inocente e sagaz imaginação.
E me pego em caricias invisíveis. Inexistentes. Vazias.
Mas tudo isso...
Foi só um beijo. Ou alguns beijos. Que diferença faz se não
vai voltar a acontecer? Da mesma forma como vou esquecer?
Alguém, por favor, me faça esquecer. Me lembre de esquecer.
"Preencha minhas lacunas" "Preencha meus buracos"
Alguém, por favor, me faça esquecer. Me lembre de esquecer.
"Preencha minhas lacunas" "Preencha meus buracos"